Alguma vez se perguntaram, porque é que pessoas tão cuidadosas, acabam por ser infectadas pelo HIV?
Se pensarem bem, a resposta pode ser simples, tal como nos diz a jornalista Alexandra Borges:
''São mulheres com quem nos cruzamos todos os dias na rua. Têm filhos, emprego, família e marido, como todas nós. Confiaram cegamente naqueles que amaram e acabaram seropositivas. Primeiro, pensaram que iam morrer, depois aprenderam a sobreviver e a conviver com a doença, até porque os filhos precisam de conselhos para não caírem na mesma armadilha.''
Pois bem, é isto que nos vão mostrar as próximas testemunhas, que passaram de frágeis a corajosas.
A história da Maria:
''Não confiem em ninguém, nem nos vossos maridos!'', repete insistentemente, Maria que, aos 51 anos, descobriu que era seropositiva. ''Andava sempre constipada e resolvi ir fazer um exame geral com a minha médica de família que, dias depois, me chamou de urgência para me informar de que estava infetada!'', relembra com voz embargarada.
Maria era mulher de um homem só, o pai dos seus quatro filhos, por isso, era ele quem tinha de lhe explicar a doença.''Fui ter com o meu marido e agradeci-lhe a herança que me tinha deixado, confrontei-o com o facto de que, se não lhe tivesse sido fiel durante 25 anos, poderia ter infetado, sem querer, pessoas inocentes e meti os papéis para o divórcio!'', relembra, convicta.
As vizinhas já lhe tinham contado que o marido andava em más companhias pelas noites de Lisboa, mas Maria preferiu defender sempre o casamento e o pai dos seus filhos. ''Fui burra e hoje tenho de saber viver com a doença porque os meus filhos podem ficar órfãos se eu não lutar e eles precisam de mim'', afirma, ao mesmo tempo que olha para a fotografia dos filhos. Contou a verdade aos dois mais velhos (Paulo, de 21 anos, e Graça, de 19) e poupou os mais novos (Marta, de 9, e Inês, de 4) mas exigiu que todos eles fossem testados para o VIH. Nenhum era positivo. ''Dou graças a Deus, não me ia perdoar se eles tivessem apanhado a doença!'', agradece, elevando as mãos ao céu enquanto fala.
De resto, de nada valeram as muitas vezes em que o ex-marido lhe tentou explicar o que não tinha explicação (ele já sabia que era seropositivo há 20 anos!) ou lhe pediu desculpa pelo sucedido, até porque ela nunca mais voltou a ser a mesma. ''Não quero mais homens na minha vida e aconselho os meus filhos mais velhos a terem cuidado. Antes nunca tínhamos falado de sexo, agora não perco uma oportunidade para os convencer de que não podem confiar em ninguém, só neles mesmos e, para isso, têm de ter sempre relações protegidas com preservativo e eu sou o melhor exemplo que podem ter'', afirma, acrescentando de imediato: '' É um erro pensar que mulheres seropositivas da minha idade já não têm uma vida sexual ativa. Nas consultas do hospital, conheci muitas, até mais velhas do que eu, que são bastante ativas a nível sexual.'' Não é o seu caso. Maria nunca mais se envolveu sexualmente com ninguém. ''Não quero arriscar, porque sei que os homens não gostam de usar preservativo e eu não saberia explicar-lhes, nem conseguiria obrigá-los a ter relações protegidas, portanto é melhor ficar assim: solteira e boa rapariga!''
Maria viu-se obrigada a deixar a profissão de cozinheira com a qual sustentara a sia família nos últimos 30 anos. ''Não conseguia cozinhar com luvas e comecei a ter medo de lidar com facas e, como temia, cortava-me sempre e fugia para a casa de banho onde passava horas a chorar'', confessa, com tristeza. As colegas começaram a desconfiar e, antes que tivessem certezas, Maria despediu-se. Hoje, trabalha numa loja de roupa onde ninguém sonha que é seropositiva. ''Aprendemos a mentir para nos defendermos, infelizmente tem de ser assim porque o medo e a ignorância em relação à sida ainda são muito grandes'', conclui.
Maria já está na menopausa e sente-se normal, embora se tenham agravado os problemas respiratórios e de hipertensão que a acompanharam nos últimos anos. ''Sei que tenho uma doença e que tenho de me cuidar: não falho uma consulta nem as analises e nunca me esqueço de tomar os medicamentos!'', afirma, mostrando com orgulho, o resultado das última análises de contagem das células CD-4.
in: woman (Abril 2011)